(...) Pois, voltando para aqueles tempos da estância, quando a guerra ceifava tantas criaturas e tanta juventude, contarei o que começou a suceder em maio de 1837: Giuseppe Maria Garibaldi recebeu a carta de corso para sua Mazzini - chamada desde então de Farroupilha -, assinada pelo general João Manuel de Lima e Silva, e que lhe dava autorização para singrar os mares rumo ao sul, como corsário da República Rio-grandense. Assim, partiu o italiano, da cidade do Rio de Janeiro, com uma tripulação de 12 homens. Na sumaca Farroupilha levavam armas e munições escondidas sob um carregamento de carne defumada e mandioca.
Começava aí o longo caminho que traria Garibaldi até a estância de minha tia, D.Antônia. Se eu pudesse voltar no tempo, retroceder todos esses anos, sofrer tudo o que sofri, nem que fosse para vê-lo por um único instante, como o vi pela primeira vez, parado em frente à nossa casa, naquela tarde morna e plácida de outubro, o cabelos fulvos e inquietos cintilando ao sol do pampa, se eu pudesse por o tempo a pisar suas próprias pegadas, eu não hesitaria...
Ainda ouço o metal de sua voz em meus ouvidos, quando, ao ver-me, junto com as outras, postada na varanda - afinal, era a primeira vez em muito tempo que um estranho vinha estar conosco, e sob o aval de Bento Gonçalves -, me olhou, somente e mim com seus olhos sedentos e disse:
- Como stai sinhorina? Io me chiamo Giuseppe Garibaldi. E la buona fortuna me trouxe até aqui.
( Rodrigo, aí ela faz daquele jeito né.. "Eu sei, eu sei." )
Mas isso foi em 1838, e, o general Bento Gonçalves já estava solto, Perpétua já estava noiva de Inácio José, e eu ainda tinha meus 18 anos, e não os 83 que carrego hoje, por entre essas minhas rugas que mais parecem os vincos de um vestidos de baile. Isso foi em 1838, quando todos nós ainda tínhamos sonhos.
Manuela.
2 comentários:
Minuano estático. Mansidão no ar. Pássaros calados. O sol em comunicação com a lua. Um sentimento único, peculiar. Sobre o pavilhão tricolor da liberdade, um encontro épico, que, por acaso ou determinação do destino, não se repetiu jamais, sequer perpetuou. Mas esta vida... Ah, esta vida. Não é feita de realizações! E o que vale é o desejo, a força, a vontade, mais ainda do que o próprio resultado. E viva a Manuela, que foi até o final dos seus dias, acreditando na força daquele desejo. Da época que ainda tínhamos sonhos. Da época que ainda os tínhamos.
G.G.
ai meu deus...
tu só me lembras dele!
até quando escreve!
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